sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Homens de preto invadem EMEF Amorim Lima.

- Ana, quem são eles?, perguntou uma professora.


- É o novo sistema de segurança implementado pelo governo. Agora todas as escolas serão assim, respondeu a diretora.


Uma criança cruza o corredor saltitante. Um sorriso bonito na carinha preta. O olhar que cruza com um desses homens e imediatamente o corpo se molda. Olhar cabisbaixo, cabelo escondendo o rosto.

- Vocês não se sentem mais seguro com a nossa presença aqui? Asseguramos a ordem para o progresso e o desenvolvimento do país.

Todos nós clamamos por segurança. Esse será um dos principais assuntos nos debates eleitorais que seguem até o próximo mês de outubro. Porém, a segurança está a serviço de quem? Do quê?...

- Quem são vocês?

- Quem é você?

- Eu sou o Pedro.

- Bom dia, Pedro.

- E você?

- Eu sou o 0123 (zero cento e vinte e três).

- 0123? Mas e o seu nome de verdade?

- Não me lembro.

- Como assim?

- Esse é o meu número na empresa que trabalho. Meu nome não importa. Aonde você quer trabalhar?

- No McDonalds.

- O McDonalds deve ter uns 800 mil funcionários?! Você será o 820.238.

- Eu não quero ser um número.


E pouco a pouco a molecada vai sendo posta para pensar, sua postura vai sendo moldada, pedimos uma atuação no teatro instaurado na sua realidade.

- Mas e a nossa liberdade?

- Um pouco de liberdade nós daremos a vocês. Se não, vocês poderão se rebelar contra nós.

Entre ordens de não corra, não grite, sorria menos, desfaça essa roda de conversa, um burburinho percorre as salas de aula, pátio, corredores, espaço externo. Em todos os cantos haviam olhares de desaprovação e sucção de almas e sorrisos.

- Tinha mais ou menos uns trinta...

E nós, cinco atores, só queríamos a segurança de todos.

Nos EUA está em teste chips que são instalados em prisioneiros para controlar todos os seus passos. Se tudo der certo, não houver nenhum efeito colateral, ao nascer, os bebês já receberão esse chip.

- Eu não vou colocar esse chip de jeito nenhum.

- Não é uma escolha. Você nasce e pertence a esse sistema.

- E o que a gente vai poder fazer?

- Trabalhar. (Pausa). Trabalhar. (Pausa). E... Trabalhar. Ah...

- Eu quero é andar de skate... E bater punheta...

- Não pode.

- E o que mais a gente vai poder fazer?

- Ter uma família, cuidar da sua mulher e filhos.

- E se eu for gay?

- Se gerar lucro, podemos até aceitar.

Em cada canto da escola um ator. Em volta de cada ator, uma roda de criança. Em cada criança, perguntas, desafios, discussões.

- Isto aqui, nós, é verdade ou ficção?

Não sabemos mais. Atores que foram contratados por uma empresa de segurança, personagens que fingem, crianças que se indignam com a representação montada. O teatro que instaura uma ruptura no cotidiano e coloca-nos para pensar. Re-pensar o cotidiano em suspensão.

Hoje, são tantas filmagens nossas que poderíamos ser personagens de filme. Para onde vão esses vídeos? Para quem nos vê em uma filmagem esperando na fila do banco, conversando com o atendente da loja, parado no elevador, somos personagens ou pessoas reais.

Eis que chega o Batman para abrir o jogo da ficção. Ele que conhece a cidade como palma da mão, conhece cada beco escuro, traficantes e ladrões, vem para proteger e oprimir.

Delicada relação.

Todos clamamos por segurança. Para defender nossas vidas e propriedades.

E para aqueles que nada tem? Esperam por que?

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